Em meio a um cenário de crescente pressão por sustentabilidade e inclusão social, o Brasil avança na implementação de novas políticas de reforma agrária e ordenamento territorial, buscando promover a justiça social e o desenvolvimento rural sustentável. A recente reestruturação do Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA) e o fortalecimento de medidas de ordenamento territorial visam enfrentar problemas históricos de concentração de terras e promover a ocupação planejada e inclusiva do território brasileiro.
Com a nova abordagem, o governo brasileiro espera melhorar a qualidade de vida de milhões de agricultores familiares e sem-terra, ao mesmo tempo que busca assegurar a preservação ambiental e a racionalização do uso dos solos. O tema, no entanto, continua a ser alvo de intensos debates e disputas, especialmente nas áreas de grande interesse agrícola e ambiental, como a Amazônia Legal e o Cerrado.
Um Novo Modelo de Reforma Agrária
O novo modelo de reforma agrária, implementado em 2024, traz inovações no processo de distribuição de terras, com maior ênfase na sustentabilidade e no apoio técnico aos assentados. A principal novidade foi a criação do Plano Nacional de Agroecologia para Assentamentos (PNAA), que incentiva a adoção de práticas agrícolas sustentáveis nos assentamentos, promovendo uma transição agroecológica e fortalecendo a agricultura familiar.
“Queremos garantir que os beneficiários da reforma agrária tenham não apenas a posse da terra, mas também as condições para produzir de forma sustentável e prosperar economicamente”, afirma o ministro do Desenvolvimento Agrário, Roberto Amaral.
O programa inclui, além da distribuição de terras, capacitação técnica, acesso a crédito rural, e incentivos fiscais para a adoção de tecnologias verdes, como a irrigação eficiente e a produção orgânica. O objetivo é que os assentamentos se tornem autossuficientes e produtivos, contribuindo para a segurança alimentar e a economia rural do Brasil.
Desde sua implementação, o novo modelo já assentou mais de 50 mil famílias em diversas regiões do país, com destaque para estados como Maranhão, Pará e Bahia, onde há grande demanda por regularização fundiária.
Ordenamento Territorial: Planejamento e Sustentabilidade
Paralelamente à reforma agrária, o Brasil está intensificando suas políticas de ordenamento territorial. O Plano Nacional de Ordenamento Territorial (PNOT) foi revisado e ganhou um novo escopo em 2023, com foco em ordenar o uso e ocupação do solo em regiões de expansão agrícola, áreas de proteção ambiental e territórios de populações tradicionais.
O ordenamento territorial visa a garantir que o uso da terra siga critérios de sustentabilidade e inclusão, evitando a degradação ambiental e os conflitos fundiários, que historicamente marcaram o campo brasileiro. Uma das principais áreas de atuação do PNOT tem sido a Amazônia, onde o desmatamento ilegal e a grilagem de terras têm causado grandes impactos ambientais.
Em resposta, o governo, em parceria com ONGs e o setor privado, está implementando projetos de uso racional da terra que combinam produção sustentável com conservação ambiental. Um exemplo é o programa “Amazônia Verde”, que visa proteger áreas de floresta ao mesmo tempo em que desenvolve projetos de agricultura de baixo impacto e manejo sustentável de recursos naturais.
“O ordenamento territorial é uma peça-chave para o desenvolvimento sustentável. Sem um planejamento adequado do uso da terra, o Brasil continuará a enfrentar desafios como a degradação ambiental e a desigualdade fundiária”, comenta a geógrafa e pesquisadora Maria Helena Pereira.
Conflitos e Desafios Persistentes
Apesar dos avanços, a reforma agrária e o ordenamento territorial no Brasil enfrentam desafios significativos. Um dos principais entraves é o conflito agrário em áreas de grande interesse econômico, como no Cerrado e na Amazônia. Disputas entre grandes proprietários rurais, grileiros e comunidades tradicionais, como indígenas e quilombolas, continuam a gerar tensões e, em alguns casos, violência.
De acordo com dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), o número de conflitos por terra aumentou nos últimos cinco anos, especialmente em áreas de expansão agrícola. Para amenizar essas tensões, o governo tem promovido a mediação e criado mesas de negociação entre as partes envolvidas, mas os desafios permanecem.
Além disso, a regularização fundiária é um ponto crítico no processo de ordenamento territorial. Milhares de agricultores e comunidades tradicionais ainda vivem sem a posse legal de suas terras, o que impede o acesso a políticas públicas e cria um ciclo de pobreza e insegurança. O programa de regularização fundiária, lançado em 2023, tem como meta formalizar a posse de terras para mais de 200 mil famílias até 2026, priorizando áreas de alta vulnerabilidade social.
Outro desafio é a conservação ambiental em áreas de produção agrícola. Muitos especialistas apontam que o avanço da fronteira agrícola, especialmente no Cerrado e na Amazônia, precisa ser feito com critérios rígidos de sustentabilidade, para evitar a perda de biodiversidade e o esgotamento de recursos naturais. “A conciliação entre produção agrícola e preservação ambiental é fundamental. Precisamos avançar em práticas que conservem o solo e os recursos hídricos, sem comprometer a produtividade”, alerta a bióloga e ambientalista Ana Lúcia Cardoso.
Perspectivas Futuras
Apesar dos desafios, as perspectivas para a reforma agrária e o ordenamento territorial no Brasil são promissoras. A integração de políticas públicas focadas em sustentabilidade, inclusão social e inovação tecnológica está criando uma nova fase no desenvolvimento rural do país. Governos estaduais, como os do Ceará e Pará, estão implementando projetos de uso da terra baseados em mapeamento digital e georreferenciamento, que permitem uma gestão mais eficiente e planejada do território.
Além disso, a participação da sociedade civil, movimentos sociais e ONGs está garantindo maior transparência e eficiência nos processos de distribuição de terras e conservação ambiental. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), por exemplo, tem adotado uma nova postura, promovendo parcerias com cooperativas agrícolas e empresas de tecnologia para aumentar a produtividade nos assentamentos e fortalecer a agroecologia.
“Estamos em um momento de transformação. Com políticas adequadas e participação ativa das comunidades, é possível construir um modelo de reforma agrária que seja socialmente justo e ambientalmente sustentável”, afirma João Pedro Stédile, líder do MST.
No longo prazo, a consolidação de uma reforma agrária inclusiva e de um ordenamento territorial planejado será essencial para reduzir as desigualdades regionais e impulsionar o desenvolvimento rural no Brasil, garantindo que o país avance rumo a um futuro mais equilibrado, produtivo e sustentável.