30 de abril de 2025
Desenvolvimento regional Território

Desafios para o desenvolvimento da Região Nordeste

O Nordeste brasileiro reúne muitas riquezas culturais e econômicas, mas enfrenta desigualdades históricas. Desenvolver a região exige planejamento estrutural, inovação produtiva e políticas públicas consistentes com foco na inclusão social

 

O Nordeste brasileiro possui grande diversidade cultural, histórica e econômica, mas ainda enfrenta desafios estruturais para seu desenvolvimento. Entre os principais entraves estão a desigualdade social, a necessidade de maior dinamização econômica, a urbanização desordenada, a falta de infraestrutura adequada e os altos índices de violência.

A partir de contribuições de autores como Gunnar Myrdal, François Perroux, Albert Hirschman, Raúl Prebisch, Celso Furtado e, mais recentemente, Milton Santos, Bertha Becker e Tania Bacelar, o governo brasileiro implementou diversas iniciativas para mitigar as disparidades de oportunidades entre as suas regiões. Marco importante desse processo foi a criação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), em 1959. Diante de desafios como a seca, a baixa produtividade agrícola e uma economia pouco diversificada, a SUDENE promoveu a modernização da agricultura e a industrialização do Nordeste, oferecendo incentivos fiscais e financeiros para atrair investimentos e diversificar a base econômica local. 

Também merecem destaque a criação: do Banco do Nordeste, em 1952; do Fundo Constitucional de Financiamento para a Região Nordeste (FNE), em 1988; do Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FNDE), em 2001; do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento do Nordeste, em 2019; e do Plano Regional de Desenvolvimento do Nordeste (PRDA), cuja versão mais recente foi divulgada em 2024. Tais instituições e instrumentos mobilizam e articulam políticas, programas e ações que visam contribuir para o desenvolvimento da região.  

No entanto, como observado nos artigos sobre as regiões Norte e Centro-Oeste, parte desses esforços ainda está concentrada em atividades nas quais o país possui vantagens comparativas, perpetuando a especialização na exportação de commodities. Esse dualismo, caracterizado pela coexistência de setores econômicos avançados e atrasados no mesmo território, favorece a consolidação de enclaves com baixa capacidade de geração de empregos e pouca disseminação de inovações para outros segmentos produtivos. Como apontou Milton Santos, lugares globais conectados ao circuito superior da economia coexistem com áreas relegadas ao circuito inferior, caracterizado por atividades de baixa produtividade, informalidade e ausência de integração com as atividades econômicas tecnologicamente avançadas. Essa dinâmica impede a disseminação dos benefícios do progresso técnico para toda a sociedade.

Apesar de ainda estar atrás das demais regiões do país nos indicadores sociais e econômicos básicos, políticas nacionais como a elevação real do salário mínimo, as transferências de renda, a ampliação do acesso ao crédito e o fortalecimento da agricultura familiar contribuem para a redução das desigualdades sociais no Nordeste. Avanços importantes também ocorreram no ensino fundamental, com destaque para o Ceará, e no ensino médio, especialmente em Pernambuco. Além disso, está em curso a transição para uma matriz energética mais sustentável, com crescimento da geração de energia eólica e solar. 

Para fortalecer a inclusão produtiva e reduzir as desigualdades, é imprescindível a distribuição equitativa de oportunidades. A universalização do acesso à água e sua gestão eficiente são aspectos essenciais para garantir qualidade de vida e segurança hídrica na região, sobretudo no Semiárido. A desconcentração do acesso a terras cultiváveis (acompanhada da ampliação do crédito e da assistência técnica) é necessária para a expansão da agricultura familiar, essencial para a segurança alimentar e o desenvolvimento rural. Investimentos em infraestrutura, incluindo melhorias nos portos e aeroportos e a ampliação da rede ferroviária, são essenciais para reduzir os custos logísticos e atrair novos investimentos. De forma integrada com essas iniciativas, é fundamental fortalecer a base científico-tecnológica com ênfase no ensino técnico profissionalizante. 

A proximidade com mercados consumidores e a possibilidade de exportação por meio dos portos estratégicos são fatores que favorecem a região. O Polo Industrial de Camaçari, na Bahia, o Complexo do Pecém, no Ceará, e o Complexo Industrial e Portuário de Suape, em Pernambuco, são referências para impulsionar as capacidades instaladas na região em áreas como agroindústria, biotecnologia, energias renováveis, tecnologia da informação, economia criativa e turismo. A ascensão da Indústria 4.0, com a digitalização dos processos produtivos e a automação, oferece novas oportunidades em atividades de alto valor agregado. O fortalecimento de polos tecnológicos como o Porto Digital, em Recife, e a criação de parcerias entre universidades, centros de pesquisa e empresas são cruciais para impulsionar a inovação e aumentar a produtividade do trabalho.

Entres as prioridades para o desenvolvimento sustentável da Região Nordeste, podemos destacar: 

  • Fortalecimento da educação técnica e profissionalizante;

  • Incentivo à criação de polos de tecnologia e inovação;

  • Adensamento tecnológico das cadeias produtivas regionais;

  • Expansão da economia criativa e da infraestrutura turística;

  • Expansão da oferta de energia renovável, especialmente solar e eólica;

  • Investimentos em infraestrutura de transporte e logística, com ênfase nos modais ferroviário e aéreo;

  • Expansão da indústria naval e offshore;

  • Uso sustentável dos recursos naturais, inclusive os marinhos e costeiros;

  • Ampliação do acesso à água para seus múltiplos usos, incluindo dessalinização e captação de água da chuva; e

  • Estruturação de uma rede de cidades capaz de melhorar a provisão de serviços básicos.

O grande desafio está na capacidade de harmonização no tempo e no espaço de iniciativas de diferentes poderes, entes federados e agentes privados. Para que o Nordeste possa consolidar um modelo de desenvolvimento inclusivo e sustentável, é essencial que as iniciativas tenham escala, abrangência e duração suficientes para transformar de forma estrutural a realidade social e econômica da região. Isso exige atenção permanente para que os instrumentos de promoção do desenvolvimento regional não sejam desvirtuados em benefício de interesses particulares. 

 

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Márcio Gimene é Analista de Planejamento e Orçamento. Mais informações: www.gimene.com.br.