12 de abril de 2025
Desenvolvimento regional Território

Desafios para o desenvolvimento da Região Centro-Oeste

Nas últimas décadas, o Centro-Oeste se tornou uma das regiões mais dinâmicas da economia brasileira, alcançando o maior PIB per capita. Mas desenvolvimento sustentável e inclusão social ainda precisam melhorar

Os esforços e investimentos realizados pelo governo brasileiro contribuíram para que a região Centro-Oeste se consolidasse como uma fronteira importante de expansão econômica. Conforme indica o Gráfico 1, nas duas décadas iniciais do século 21 o PIB per capita da região Centro-Oeste passou do terceiro para o primeiro lugar na comparação com as demais regiões do país.

Gráfico 1 – Razão entre o PIB per capita regional e o PIB per capita nacional – 2000 e 2020

Entre os fatores que contribuíram para o crescimento econômico da Região Centro-Oeste destacam-se a criação: de Brasília, em 1960, como nova capital federal; da Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste (SUDECO), em 1967; da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em 1973; do Fundo Constitucional de Financiamento para a Região Centro-Oeste (FCO), em 1988; do Fundo de Desenvolvimento do Centro-Oeste (FDCO), em 2009; do Plano Regional de Desenvolvimento do Centro-Oeste (PRDCO), cuja versão mais recente foi divulgada em 2024; e dos diversos instrumentos de financiamento público e apoio às atividades produtivas ofertados, por exemplo, pelo Banco do Brasil e pelo Bndes. Tais instituições e instrumentos mobilizam e articulam políticas, programas e ações que, explícita ou implicitamente, têm sido decisivos para o desenvolvimento da Região Centro-Oeste.

No entanto, como observado neste artigo, grande parte desses esforços segue concentrada nas atividades em que o país possui vantagens comparativas, perpetuando a especialização na exportação de commodities. O dualismo, caracterizado pela coexistência de setores econômicos avançados e atrasados no mesmo território, favorece a consolidação de enclaves com baixa capacidade de geração de empregos e pouca disseminação de inovações para outros segmentos produtivos. Como dizia Milton Santos, lugares globais altamente conectados ao circuito superior da economia coexistem com áreas relegadas ao circuito inferior, caracterizado por atividades de baixa produtividade, informalidade e ausência de integração com as atividades econômicas tecnologicamente avançadas. Essa dinâmica impede que os benefícios do progresso técnico sejam disseminados na estrutura produtiva.

O resultado é um crescimento econômico concentrado em poucos locais e setores, sem alcançar grande parte da população ou impulsionar a diversificação econômica. Esse padrão impede que a renda média dos trabalhadores acompanhe os ganhos de produtividade registrados nos setores mais dinâmicos. Além disso, a baixa integração entre os segmentos produtivos reduz a capacidade de o progresso técnico melhorar as condições gerais de vida. Como resultado desse dualismo, o Brasil permanece preso a um modelo econômico que beneficia apenas uma parcela restrita da sociedade. Os ganhos de produtividade concentram-se nos setores exportadores e em poucos nichos industriais e de serviços, sem promover uma distribuição efetiva de renda ou criar oportunidades de inclusão para trabalhadores menos qualificados.

Na Região Centro-Oeste, um dos maiores desafios é consolidar uma ocupação agroindustrial de maior qualidade, diversificada, menos degradadora do meio ambiente e mais inclusiva da força de trabalho. A expansão da agroindústria de grãos, associada à pecuária, pressiona o Cerrado e a Floresta Amazônica. A intensificação e ampliação da produção nas áreas já utilizadas pela agropecuária exigirão novos investimentos em infraestrutura e padrões de produção mais cuidadosos com a conservação ambiental.

Um diferencial que pode favorecer a região é a sua posição estratégica no “coração” da América do Sul. Esse aspecto foi destacado por Mario Travassos na década de 1930, que via com preocupação a influência exercida pela Argentina sobre os países vizinhos. O capitão do Exército brasileiro observou que além de possuir ligação natural com o Atlântico, a Argentina já dispunha de conexões ferroviárias com Assunção (Paraguai), La Paz (Bolívia) e Santiago (Chile), possibilitando alcançar também o Pacífico. Para mitigar a influência argentina sobre os países vizinhos, Travassos sugeriu que o governo brasileiro trabalhasse para ampliar as conexões ferroviárias no sentido Leste-Oeste, oferecendo novas alternativas para que Paraguai e Bolívia alcançassem o Atlântico. Sobre essa questão, Therezinha de Castro desenvolveu posteriormente o conceito de centripetismo rioplatense: tendo em vista que os rios Paraguai, Paraná e Uruguai divergem em suas nascentes, mas convergem em uma única direção (a foz do Prata), conformava-se assim um centro geopolítico comum, controlado por Buenos Aires.

Embora seja difícil precisar em que medida as preocupações geopolíticas influenciaram a interiorização dos investimentos em ferrovias e rodovias no território brasileiro, o fato é que essa interiorização ocorreu, e isso favoreceu o desenvolvimento do Centro-Oeste brasileiro e a integração com os países vizinhos. Movimento esse que está sendo reforçado pelo dinamismo econômico da China e outros países asiáticos, o que estimula a busca por conexões multimodais entre os oceanos Atlântico e Pacífico. Cabe observar que duas das cinco Rotas de Integração e Desenvolvimento Sul-americano que o governo brasileiro está buscando consolidar com os países vizinhos passam pelo Centro-Oeste: a Rota do Quadrante Rondon e a Rota de Capricórnio.

O desafio é fazer com que a ampliação dos fluxos de comércio internacional seja acompanhada pelo avanço de atividades produtivas de maior valor agregado, que proporcionem melhores salários e qualidade de vida para o conjunto da população. Nesse sentido, entre as prioridades para o desenvolvimento sustentável da Região Centro-Oeste podemos apontar:

  • investir em melhorias na malha aérea, ferroviária e hidroviária, para reduzir custos de transporte e fortalecer a integração nacional e sul-americana, inclusive com os portos do Pacífico, que precisam de adaptações para os tipos de carga a granel, conteinerizada e refrigerada.
  • avançar na digitalização e na facilitação aduaneira nos passos de fronteira;
  • ampliar a oferta de educação técnica e superior em áreas como gestão agroindustrial e tecnologia da informação;
  • implementar práticas de manejo sustentável para conservação do Cerrado e Pantanal, combatendo o desmatamento e promovendo a recuperação de áreas degradadas;
  • ampliar a geração de energias renováveis, como solar, eólica e biomassa;
  • estimular a bioeconomia e o uso de biocombustíveis;
  • incentivar a adoção de tecnologias limpas na agricultura e pecuária, como sistemas integrados de produção e manejo de solo; e
  • estimular atividades industriais e serviços que utilizem tecnologias avançadas.

Como nas demais regiões brasileiras, uma incerteza relevante diz respeito à harmonização, no tempo e no espaço, de iniciativas de diferentes poderes, entes federados e agentes privados. Para que o Centro-Oeste brasileiro possa consolidar um modelo de desenvolvimento inclusivo e sustentável, é essencial que as iniciativas tenham escala, abrangência e duração suficientes para que os benefícios do crescimento econômico e dos fluxos de comércio internacional sejam compartilhados pelos habitantes da região.

Márcio Gimene é Analista de Planejamento e Orçamento. Mais informações: www.gimene.com.br.